sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Quantum of Solace (2008)

AMIGOS, ATENÇÃO: tive a oportunidade de assistir à pré-estréia de Quantum of Solace na companhia de um sábio-sênior que muito me iluminou sobre Bond e fiz esse breve comentário depois de algumas reflexões noturnas. Pensei muito se deveria quebrar a ordem dos filmes postados aqui, e decidi que deveria aproveitar a oportunidade de comentar o filme antes que a maioria das pessoas o assista. Evitei contar detalhes, para não estragar a surpresa. Também não consegui fotos além das oficiais. Estão todos avisados!
Decidi que ao terminar de comentar todos os filmes, voltarei a comentar Quantum of Solace, concluindo essa saga.

Tendo dito, até!



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Bruto. Violento, habilidoso, frio e sem nenhuma sofisticação. Esse Bond de Daniel Craig é uma mistura de Jason Bourne com o Homem-Aranha. Bêbado, o atual 007 tenta dar a complexidade moral que outrora George Lazemby deu, mesclada à crueza típica de Timoty Dalton.


Jimmy, um pouco abatido

O filme é muito bom: além de não perder o ritmo em nenhum momento, mantendo o nível de tensão pelas quase duas horas, a complexidade do argumento é das mais sofisticadas de todos os filmes da série. Dessa vez, Bond consegue capturar um dos membros da organização secreta da qual participava sua amada, Vesper Lynd (a inesquecível Eva Green). Ele é motivado pela vingança e ódio, por ter perdido a mulher que o traíra. Mas capturar Mr. White acaba o levando às pistas para descobrir o funcionamento da organização criminosa.


A mocinha... que só conheceu o vilão


Essa organização, anônima, é mais interessante que a SPECTRE e outros vilões grotescos que figuraram em filmes anteriores. Eles não querem acabar com o mundo, nem desorientá-lo. Não são maníacos doentes. São capitalistas. Estão procurando oportunidades lucros acima do normal através de inovações, constrangimentos à concorrência, rent seeking e monopólios institucionais. Para isso, evidentemente fogem da legalidade. Estão infiltrados “em todos os lugares” e operam negócios em muitos setores, praticamente a firma multidivisional, desde que lucrativos.
A empreitada do momento é um golpe de estado na Bolívia, que destituiria o atual governo para levar ao poder um general maldoso. Em troca dessa ajuda, conseguiriam contratos privilegiados de exploração de uma grande região desértica boliviana, além da concessão superfaturada do fornecimento de água do país.


Os vilões, o general boliviano e o eco-chato-picareta

O legal é que a guerra fria definitivamente acabou. O vilão é uma organização criminosa mundial, que conecta interesses de todos os lados, inclusive dos EUA (a CIA ajuda a organização a dar o golpe) e também o Reino Unido (quase que degolam 007, afinal os ingleses também precisam de algum fornecimento de petróleo...). Quando diferenciar os amigos dos inimigos torna-se algo difícil, aproxima-se da complexidade real do mundo e a única coisa que pode sobrar são os princípios.
Se no passado o princípio era o mundo livre ocidental, agora é mais difícil identificar o que é o certo. James Bond agarra-se ao principio de justiça, retidão moral e, quiçá, meritocracia. Pilares fundamentais da tal civilização ocidental que outrora rivalizava com os comunistas. Entretanto, nos dias atuais o ocidente – e seus governos – estão impregnados de gente que foge a esses princípios. Cabe a Bond puni-los.
Como curiosidade do filme, Jimmy não conhece muitas mulheres. Com a mocinha mesmo ele não passa de um beijo de canto. Quase um selinho. Dorme apenas com uma funcionária da embaixada inglesa na Bolívia, mrs. Fields (cujo primeiro nome é Strawberry, mas só aparece isso nos créditos finais), que acaba morta pelos vilões e é encontrada nua, estirada na cama, inteira coberta por petróleo numa clara alusão à clássica cena de Goldfinger, em que Jill Masterson é econtrada morta coberta de ouro.
O personagem James Bond, que conhecíamos e idolatrávamos, morreu. Não há mais a sofisticação, os bons vinhos, boa comida, o profundo conhecimento da história e dos costumes. Também não há mais o senso de humor peculiar nem a conquista incansável de mulheres descartáveis (elementos que terminaram junto com a era Moore). Não há nem os brinquedinhos que nos encantavam. A tecnologia impressiona, mas está restrita aos instrumentos dentro do escritório do MI6. Ressalva apenas para o celular, que é um terminal do escritório. Sinal dos tempos...
O que temos é um novo Bond. Mas defendo que não seja um novo personagem, mas apenas o Bond novo, ou seja, o filme mostra a construção, a origem, do personagem. Identificando as experiências e conflitos individuais que formaram o caráter de 007. A década de 2000 é marcada por filmes assim, que buscam explicar a formação psicológica dos nossos heróis (cito de cabeça, não exaustivamente, o Batman, Hulk, Homem-Aranha, Superman...).


Bond, e a funcionária da embaixada (moranguinho)


Digo isso porque há grande similaridade entre o Bond de Craig com o Bond dos livros originais de Flaming. Espero que não se trate de um retorno às origens, mas apenas de uma explicação das origens.
Outra curiosidade é que a cena típica de abertura, que vê-se Bond na mira de um revolver andando da esquerda para a direita até que atire, aparece apenas no final do filme, como conclusão, e não como abertura. Tomei isso como um sinal de que daqui pra frente Bond, tal como conhecíamos, aparecerá de novo. Ou seja, que os dois filmes com Craig são uma introdução, uma explicação de sua formação pessoal.


Bond e moranguinho, no único momento de descontração


É provável que eu esteja tentando me auto enganar. James Bond segue sua geração, seu tempo. Esse é um reflexo dos dias de hoje: dias que os jovens não sabem ao certo como é amar sem camisinha. Toda a experimentação de drogas e quebras de tabus sociais e sexuais já foram feitas. Nossos heróis morreram de overdose há mais de vinte anos. Nossos líderes são moralmente fracos e ideologicamente pouco consistentes...
Assistirei outras vezes esse filme para refletir melhor. Essas foram apenas minhas primeiras impressões.

3 comentários:

Felix Bueller disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Felix Bueller disse...

Caro Josemba,

Antes de mais nada há algo de spoiler abaixo, peço que quem não assistiu e queira assistir pare por aqui.

Acompanho em parte sua análise, porém i) sem o tom otimista (auto-engano, na minha opinião) com que se encara este filme de james bond e ii) com sincero desprazer ao deixar a sala do cinema. Faltou muita coisa.

Explico. A nata de James Bond sempre foi como colocou Josemba: boa cama, bons carros, bons brinquedos, bons vilões e boas moças. E bons drinks. Com classe, como você vem defendendo nos seus brilhantes ensaios.

Este filme é ridículo. O único carro bacana do início (um belo Aston Martin) é destruído nas primeiras cenas. Não há brinquedos e o MI6 abandonou os velhos escritórios britânicos por um ambiente high tech patéticos(quem precisa de painéis com touch screen?). Em termos de mulheres, realmente a única excepcional parte do filme são as fotos (lembranças) da própria Vesper (Eva Green), que pra sintetizar de alguma forma é o grande motivo deste filme. A inglesinha é engraçadinha mas a boliviana é uma péssima atriz e, convenhamos, já tivemos melhores agentes (e mais gostosas).

Eu nem vou discutir a temática geopolítica do filme posto que irrelevante, quando envolve: a) ditaduras latinoamericanas; b) Bolívia; c) indústria da seca e d) agências de inteligência como balcão de negócios. A linha que liga estes temas é tênue e mal trabalhada no filme e o grande vilão, pra mim, não assusta ninguém.

Bond está sem noção. A licença para matar o tornou um louco Chuck Norris de black tie. É um alcóolatra: vai para os fantásticos drinks apenas uma vez na tentativa de afogar as mágoas (e não é martini nem whisky). Ele bate em todas as pessoas, todas, sem exceção (pode ser homem, mulher ou bixa, pode ser do MI6, da CIA, SPECTRE, pode ser taxista ou pescador) - agora nosso agente é democrático. Ele se tornou um midas da morte, porque todo mundo que é tocado por ele morre de alguma forma nas cenas seguintes.

Não vou comentar nem da abertura que, na minha opinião, junto com o filme e a trilha, são os mais mal trabalhados desde os anos 80 (a música tema inclusive). Palmas apenas para as pequenas homenagens do filme, particularmente a inglesinha banhada em petróleo na cama.

Em palavras: este filme poderia ter sido rodado com 5 cenas no final do Casino Royale ou lançado na parte de trás de um pacote com massa para fazer bolo.

Espero, sinceramente, que você esteja certo com relação aos próximos filmes.

Tendo dito, até.

Carlos Josemberg disse...

Camarada Felix,

Seus comentários são muito bem vindos. Concordo que o nosso velho e querido James Bond morreu. Mas isso já tinha acontecido com o fim da era Roger Moore.

O importante é se adaptar!

Vou refletir mais sobre isso...

Atenção para outra referência aos filmes antigos: quando ele pula do avião sem para-quedas, é a mesma coisa que acontece na introdução do Moonraker...

Até!